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Ressignificando a Liberdade: O combate à violência contra mulher e a redução dos índices de feminicídio em Guarapuava

21/12/2020

Na quarta reportagem da série Não Termina Aqui, em comemoração aos 201 anos de Guarapuava, contaremos a história de uma guarapuavana vítima de violência doméstica que foi atendida juntamente com as filhas pela Secretaria de Políticas Públicas para as Mulheres. Ela representa as mais de 3 mil mulheres que nos últimos oito anos encontram apoio e meios para se libertarem do medo e da violência. Acompanhe!!


 

Abrir portas e construir possibilidades de melhorar a vida de cada pessoa é um sonho de todos que aqui vivem. E a liberdade é realmente um dos bens mais preciosos, desejada não apenas por quem está atrás das grades. Algumas amarras sociais e culturais ainda prendem muitas mulheres em relacionamentos abusivos durante anos, e vitimadas por um ciclo de violência, essas mulheres são forçadas a situações humilhantes e, em muitos casos, são mortas sem poder de defesa.

 

Guarapuava não era um local tão acolhedor para mulheres há 10 anos. Era necessário urgentemente mudar todos os paradigmas de uma cultura machista e que fechava os olhos para muitas mulheres. Foi então que em 2013 o poder público criou uma Secretaria dedicada especialmente pra elas: A secretaria de Políticas Públicas para Mulheres. E como primeira ação a administração já tinha um dever enorme: salvar vidas, pois Guarapuava estava com números altíssimos de feminicídios e era uma das cidades com muitos casos de violência contra a mulher.

 

 

Secretaria de Políticas Públicas para as Mulheres atende vítimas de violência desde 2013 – Imagem Ilustrativa

 

Veja mais no vídeo disponível no site do G1, clicando aqui: Resignificando a liberdade.


 

Criação da Secretaria de Políticas Públicas para as mulheres tinha como primeira missão reduzir os índices de violência doméstica em Guarapuava

E essas vidas começaram a ser salvas uma por uma, como a de Narcisa (nome fictício da nossa personagem real). O que nasceu como o vislumbre de uma história de amor, terminou em pesadelo. Quando há 15 anos, Narcisa, ainda jovem foi morar junto com o namorado, esperava uma união de companheirismo e muito amor. Porém, poucos meses depois da união, começou a perceber a verdadeira face do parceiro.

 

Os indícios do agressor começaram sutis: o aumentar da voz em meio a uma discussão, palavras agressivas para se impor e a insatisfação com tudo. Aí isso evoluiu para chutes e murros em momentos de raiva, primeiro na parede, depois em Narcisa. As idas e vindas do casal marcaram brigas e reconciliações, e o medo impedia que a vítima fizesse a denúncia para dar um basta a esse ciclo de violência.

 

O medo era compartilhado por todos da casa: a mãe e filhas da vítima também tinham pavor do agressor, sendo oprimidas dentro da própria casa. 

 

“Os últimos dois anos que eu vivi com ele foram os piores, daí a violência foi aumentado, ele começou a fazer coisas horríveis, só que eu tinha muito medo. No dia do ocorrido ele me bateu, me machucou e eu vi assim que não dava mais, que eu tinha que tomar uma atitude. Naquele dia que ele me machucou, me machucou muito, cortou meu cabelo, então eu vi que se eu não tomasse uma atitude eu não tomaria mais”, contou Narcisa.

O recomeço começou quando ela fez a denúncia, com o apoio da polícia estabeleceu o primeiro contato com a Secretaria de Políticas Públicas para Mulheres. Ali recebeu ajuda de toda equipe sendo encaminhada para a Casa Abrigo, juntamente com as filhas recebeu suporte de psicológico, jurídico e social para reestruturar a vida. 

A ajuda que recebeu da equipe foi o empurrão que faltava para recomeçar. Precisou deixar Guarapuava, mas com a indicação dos profissionais conseguiu emprego, ajuda financeira e um novo lar para se estabilizar. “Com ajuda delas, dessas meninas da Secretaria, eu consegui. Elas deram aquele empurrãozinho e hoje eu tenho uma outra vida, uma vida totalmente diferente da que eu tinha antes, e eu só tenho a agradecer a Deus e a elas, porque só não vê anjo quem não presta atenção nas pessoas que Deus põe na vida da gente, pra nos ajudar”. 

 

O apoio e auxílio oferecido ajudou muitas mulheres a se libertarem do ciclo de violência. – Imagem Ilustrativa

 

Vida salva, vida nova!

Narcisa, que assim como a flor Narciso – que representa recomeço e renascimento – ressurgiu da dor e constrói a cada dia uma nova história. As marcas do passado estão presentes todos os dias nas suas memórias e das filhas, mas não impedem ela de viver, funcionam como energia para que ela não desista de lutar pela liberdade que a duras penas conquistou.

Assim como a vida de Narcisa foi salva pela implantação de políticas públicas voltadas ao combate à violência contra mulher, pouco a pouco, com trabalho árduo, percorrendo bairros e ensinando a própria população a compreender o que é a violência de gênero, Guarapuava registrou nos últimos anos queda no número de feminicídios.

E isso aconteceu graças à implantação de políticas públicas que garantem apoio psicológico, jurídico e social, formação e qualificação de mão de obra para estimular a independência financeira e melhorar os canais de denúncia de crimes contra as mulheres.

A cultura do medo e da submissão tem sido superada com diálogo e acolhida. Às mulheres que precisam, ganham abrigo aqui ou em qualquer lugar onde se sintam protegidas. Elas, acompanhadas de seus filhos, não são esquecidas, pelo contrário, fazem parte de uma luta constante e transformadora. 

Nenhuma mulher fica sem amparo, atenção e cuidado. Um esforço conjunto que propiciou diversas conquistas pessoais e um orgulho para a cidade – que enfrenta com coragem o machismo e diminui gradativamente os índices de violência. Uma cidade que sabe do problema, mas que, ao mesmo tempo, consegue enxergar um caminho de mudanças para construir (dia após dia) uma cidade com mais equidade de gênero.

 

Eva Schran foi a fundadora da Secretaria de Políticas Públicas Para as Mulheres de Guarapuava. – Foto: Secom

 

As mudanças em políticas públicas surgiram com a força de mulheres guarapuavanas, que resolveram lutar por mudanças, como a fundadora da Secretaria da Mulher, Eva Schran.  “Os objetivos da política pública é orientar é ajudar, fazer com que a mulher perceba que ela pode ser senhora dela, que ela pode ser ela, ela ser empoderada, ela se sentir um ser humano como todos os outros, com o poder de decisão sobre a sua vida”, contou Eva.