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Exposição “A Violência Sob a Delicadeza – Chicotadas”, encerra as atividades da Semana de Combate ao Feminicídio em Guarapuava

28/07/2022

Os movimentos são lentos, quase imperceptíveis, no início. O batuque dita uma cadência perfeita e o som é um chamado à dança. Pernas e braços em sintonia na elevação do corpo buscando a espiritualidade do momento. Tempo de ancestralidade refletindo nas primeiras chicotadas coloridas…

 

O branco do tecido no chão vai ganhando rabiscos, riscos, formas disformes e harmonia, tudo ao mesmo tempo. Miscelânea de sentimentos refletindo no agora. Arte pura, delicada e bruta se fazendo no chão. Assim, tem início a performance da artista multifacetada, Vera Martins.

 

Em um evento em alusão ao Dia Estadual de Combate ao Feminicídio, lembrado em 22 de julho, mas com uma programação que durou uma semana, na noite desta quarta-feira, 27 de julho, o Teatro Municipal Marina Karam Primak foi, literalmente, palco de uma das mais brilhantes e representativas mostras de arte. Na ocasião, a artista e performer autodidata, Vera Martins, abriu a exposição de telas subjetivas e intensas de significados, “Violência Sob a Delicadeza – Chicotadas”. Logo de início, ainda na calçada do teatro, um novo painel medindo 1,70m X 2,00m foi pintado com a colaboração de diversos artistas da cidade.

 

Em entrevista, a artista falou da grande carga de representatividade e significados que a exposição tem para ela. “Primeiramente, para mim, este trabalho representa a parceria que eu tive com Curitiba. Fiz uma exposição individual no MON (Museu Oscar Niemeyer), em 2021 e, essa itinerância é um reconhecimento do trabalho que ocorreu lá (no MON). A partir de então, abriu-se um espaço da produção da minha obra para ser realizada aqui, em Guarapuava. É muito gratificante, porque eu posso percorrer outros lugares, como já aconteceu, de eu apresentar a obra na Inglaterra, em Portugal, na Alemanha. Esse viés da minha produção, esse momento específico, permite a interação com o público e foi o que ocorreu aqui em Guarapuava, nos três dias que fiquei na cidade”, contou Vera.

 

Em se tratando da luta contra o feminicídio, Vera Martins pontua que a exposição “Violência Sob a Delicadeza – Chicotadas”, não tem a intenção, de maneira alguma, de levar o público a pensar em violência ou fetiches. Para a artista, trabalhar com os “chicotes” que, ao mesmo tempo, são pincéis prontos para preencher uma tela em branco, leva as pessoas a pensarem na delicadeza e na candura do dia a dia. Conforme ressalta, a exposição é, também, um elemento educativo. “Não são chicotadas no sentido de agressão, nem de fetiches. Eu falo que ‘Chicotadas’ é um momento de catarse, porque, antes das chicotadas (na tela) as pessoas desconstroem o suporte da pintura e, nesta desconstrução, que é quando os fios são amarrados em um tubo e se tornam pincéis, a partir de então, tudo muda, tudo se inverte. Deste instante em diante, vem o momento silencioso, seguido da explosão”, pontua Vera.

 

Filha de imigrantes portugueses, a artista conta que sua arte vem da ancestralidade. À época, em Portugal, sua mãe cultivava linhaça, com muito cuidado e morosidade e fazia os fios, seguindo um ritual. Depois disso, sua avó trabalhava na tecelagem, transformando o que há pouco fora semente e planta, em tecido para lençóis. “A minha arte, a minha obra, veio da minha vida, de uma memória ancestral da minha família que remonta há mais de cem anos. Minha mãe, em Portugal, plantava linhaça e fazia o fio. Minha avó, tecia o lençol e, dessa desconstrução, algo novo se fazia. Hoje, com o fio, eu danço, eu faço uma performance. Eu não tenho uma formação acadêmica específica, a arte está em mim”, conclui.

 

A secretária da Secretaria da Mulher, Priscila Schran, disse que a obra de Vera Martins, literalmente trouxe cores para Guarapuava e que o trabalho da artista lança luz sobre um universo muitas vezes obscuro que são as vidas de muitas mulheres. “A arte da Vera faz com que a gente reflita sobre tudo o que está à nossa volta. Essa desconstrução do que é concreto e, ao mesmo tempo, a transformação de tudo por meio da delicadeza, nos instiga a buscar cada vez mais, mecanismos e suporte para dar sequência à caminhada. Há um amadurecimento nas ideias e um chamado à reflexão”, sublinha Priscila.

 

A secretária de Cultura do município, Rita Felchak, que na ocasião, também representou o prefeito Celso Góes, pontuou que a visita de Vera Martins à cidade é um verdadeiro presente para Guarapuava, pois é um grande passo para a recém-criada Secretaria de Cultura. “Como artistas, vivemos de desafios. A presença da Vera aqui em Guarapuava, hoje, enaltece nossa cidade e faz com que desperte em cada um de nós o sentimento de empatia, a necessidade de nos colocarmos no lugar do outro. É um despertar de sentimentos, sensações e de vontade de fazer cada vez mais pelo próximo. Em nome do prefeito Celso Góes, eu agradeço à artista pelos dias que esteve conosco, pelas alegrias e sentimentos que despertou em cada um que a conheceu e trabalhou com ela”, finaliza Rita.